Laboro Blog

28 de jan. de 2008

Os altos empregados no Direto do Trabalho

Pode-se dizer que os altos empregados estão inseridos em o que alguns denominam de zona gris do Direito, já que estes estariam situados, caso fosse feita uma escala hierárquica de subordinação, entre os empregados comuns (ou operários) e os autônomos.

Primeiramente, é necessário que se distinga a figura do alto empregado e a do intelectual ou profissionista.

Posto isto, o trabalho irá analisar o conceito e as hipóteses concernentes ao tema.

1. Diferença entre altos empregados e empregado intelectual

O alto empregado não se confunde com o empregado intelectual, também chamado de profissionista (1). Estes não são detentores de alto grau de confiabilidade ou de amplos poderes de gestão, nem agem em nome do empregador.

Entretanto, há que se notar, como explica Orlando Gomes, que, assim como o alto empregado, o grau de dependência do intelectual pode ser tênue, já que não apresenta alguns de seus elementos característicos, tais como a sujeição ao empregador no que tange à iniciativa ou ao método de trabalho. Isso, entretanto, não retira dele a condição de subordinado (2), mesmo porque tais empregados estão submetidos, por exemplo, a controle de horário e a certas fiscalizações.

Na verdade, para nós, os intelectuais são diferenciados dos outros mais em razão da detenção, por parte dos primeiros, do saber que pela falta de subordinação.

Como adotamos o princípio da isonomia no Brasil (3), não há diferença de tratamento jurídico entre os intelectuais e os demais empregados. As regulamentações legais existentes acerca de profissões intelectuais não contrariam o princípio isonômico, já que simplesmente regulam as especificidades das profissões.

2. Altos Empregados: conceito e características

O que principalmente diferencia os empregados simples dos altos empregados é a subordinação, que, seja jurídica ou econômica, fica atenuada no caso destes. Tais empregados agem como representantes do empregador, possuindo, pois, grande poder de iniciativa.

A diferença assenta-se também na extensão de poderes atribuídos a esses empregados e na confiança que neles é depositada.

Consoante Euclides Alcides Rocha, são altos empregados aqueles que ocupam "cargos ou funções de reconhecida importância na empresa, como autênticos co-participantes das tarefas diretivas do empresário" (4) Tal autor informa que, dentre suas características, estão as de

"independência e colaboração estreita com a direção da empresa, podendo ainda ser destacados os seguintes traços que os distinguem da maioria dos empregados: a escolha de processos de fabricação e métodos de comercialização, a manutenção de relações com a clientela, o exercício do poder disciplinar e a percepção de altos salários" (5)

Na verdade, o alto empregado é aquele que, mesmo com a subordinação atenuada, não possui a autonomia própria do trabalhador autônomo, já que não pode esquivar-se totalmente das suas obrigações. Assim, eles preenchem os requisitos fático-jurídicos da relação de emprego, mas a subordinação é atenuada, pelo que são considerados, portanto, um tipo especial de empregado.

Martins Catharino denomina o alto empregado de hiperempregado, dizendo que:

A subordinação cresce na proporção inversa do grau hierárquico. A rarefação da subordinação, do ângulo administrativo e hierárquico, coloca os altos empregados em posição fronteiriça e ambígua, jurídica e socialmente falando. São quase autônomos, ligeiramente subordinados, aparentados ao próprio empregador

(...)

Como percebem salários elevados, desproletarizam-se e vão integrar a classe média, com todas as conseqüências, inclusive psicológicas. São eles, também, subordinantes, por representação ou não.

De fato, os altos empregados não se identificam com os demais, tanto é que em países como Itália e França, eles têm seu próprio sindicato. (6)

O ordenamento jurídico brasileiro não regula tais empregados em leis diferentes, ao contrário da França, que tem uma lei para os empregados e outra para os operários, assim entendidos como trabalhadores braçais. (7)

Informa Amauri Mascaro que na Espanha a lei prevê e enumera alguns direitos dos altos empregados, prevalecendo, entretanto, a autonomia das partes como sua fonte constitutiva.

Na Itália, por sua vez,

"os dirigentes são os ocupantes da categoria mais elevada na empresa, identificando-se segundo os critérios fixados nos contratos coletivos de trabalho, aos quais o juiz está adstrito. .." (8)

Nosso ordenamento, muito embora trate na mesma lei (CLT) dos direitos dos empregados e dos altos empregados, restringe um pouco os direitos desses últimos.

Explica o Martins Catharino que, como em tais empregados a subordinação é atenuada, há uma redução de direitos pelo ordenamento jurídico:

"a proteção legal deve ser diversificada, segundo o princípio: mais e melhor proteção na razão direta do grau de subordinação. Sem isso, o Direito do Trabalho contradiz-se consigo próprio, pois converte-se em instrumento agravante de desigualdade, adotando um conceito abstrato de empregado, individualista, involutivo e anti-social."

Seguiremos a sistemática utilizada por Maurício Godinho Delgado, para quem a temática concernente aos altos empregados envolvem quatro situações, a saber: 1)empregados ocupantes de cargos de gestão ou confiança; 2) empregados ocupantes de cargos ou funções de confiança do segmento bancário; 3) o empregado sócio e 4) o diretor.

1)Empregados ocupantes de cargos de gestão ou confiança

No caso do empregado de confiança, o elemento fiduciário, comum a todos os contratos de trabalho (até mesmo em razão da pessoalidade do serviço), é destacado de forma relevante.

Deve-se ressaltar que, segundo certa doutrina, pode haver confiança depositada no trabalhador sem que ele seja um alto empregado, É o exemplo da secretária pessoal, em que o elemento fidúcia revela-se por meio de uma confiança interpessoal. Ocorre, ainda, no caso do tesoureiro, cuja função exige certa fidúcia mas que não é, ou não deveria ser, por isso, um alto empregado (9).

Do mesmo modo, nem todo alto empregado exerce um cargo de confiança, como pode acontecer com o sócio-empregado ou com o técnico.

A CLT não define o conceito de "cargo de confiança", mas os exemplifica, de forma não taxativa (10), nos seus artigos 224 e 62. Segundo o art. 62, são considerados ocupantes de cargos de confiança os gerentes, assim considerados os exercentes de cargos de direção, os diretores e chefes de departamento ou filial.

Antes de 1994, o conceito de cargo de confiança era mais restrito, pelo que se exigia que o empregado fosse investido de um mandato, ou seja, ocupava cargos de confiança somente o empregado de altíssima hierarquia. Após a modificação do art. 62 da CLT, passou-se a considerar, também, como cargo de confiança, a chefia de departamentos e filiais.

É de se notar, porém, que, mesmo após a referida ampliação, deve ser respeitado o espírito da norma, qual seja, a incompatibilidade do rígido controle da jornada com os amplos poderes do empregado. Uma vez comprovado o efetivo controle, há direitos ao recebimento das horas extras.

1.1 Restrições:

Podemos citar certas restrições de direitos aos altos empregados que exercem cargos de confiança: inexistência de direito ao recebimento do valor correspondente às horas-extras trabalhadas (11), possibilidade de alteração de condições de trabalho em relação à função (12), salário (13) e transferência do local de trabalho. (14)

Agora, com a nova lei de falências, que restringiu a preferência dos créditos trabalhistas ao limite de 150 salários mínimos (15), nota-se outra restrição aos direitos dos altos empregados, já que, no caso de terem direito a valor superior ao mencionado, serão qualificados como credores quirografários.

É de se notar que há uma Ação Direta de Inconstitucionalidade contra esta norma, ajuizada pela Confederação Nacional das Profissões Liberais (CNPL), sob o argumento, dentre outros, de que a regra ofende o princípio da igualdade. De fato, acreditamos que se a Constituição veda a distinção em diversas formas (tipos de trabalho, salários e exercício de funções), não deve a lei distinguir os créditos trabalhistas. Mesmo porque, ainda que o objetivo desta norma fosse evitar fraudes e conluio entre os altos empregados e o empregador, ela acabará por prejudicando os demais empregados, inclusive empregados simples. (16)

2) Bancários Ocupantes de Cargos de Gestão ou Confiança.

Ocupam cargo de confiança os bancários que exercem cargos de direção, gerência, fiscalização, chefia e equivalentes, ou, ainda, que desempenhem outros cargos de confiança. (17) Dentro desta brecha legal, a jurisprudência inclui o empregado subchefe, subgerente e o tesoureiro.

Além do mais, será necessário que a remuneração do empregado seja acrescida de 1/3 do salário do cargo efetivo,

Nota-se, pois, que a noção de cargos de confiança no caso do bancário é mais ampla, e o acréscimo salarial é menor, concluindo-se, portanto, que o bancário é mais prejudicado que os demais empregados exercentes de cargos de confiança.

O TST entende que os bancários ocupantes dos cargos de chefia, subchefia, gerente, subgerente e tesoureiro têm a jornada de 8 horas diárias, com direito ao percebimento de horas extras a partir da 8ª hora (Enunciado 232, TST).

Restrições

As mesmas restrições anteriormente aludidas aplicam-se aos bancários, com a exceção da existência do direito, por parte dos bancários, ao percebimento de horas extras excedentes à 8ª hora trabalhada.

Se o bancário, ressalte-se, se enquadrar na hipótese do art. 62 da CLT, tal norma será aplicada e não o art. 224.

por Florença Dumont Oliveira
acadêmica da Faculdade de Direito da UFMG – Belo Horizonte